16 de mar. de 2008

Classificação animal e seleção do Gir

Por Sten Johnsson

Há um bom tempo acompanho o debate entre criadores de Gir. Enquanto os criadores da tendência Gir Leiteiro fundamentam a seleção basicamente no controle leiteiro, os criadores da tendência Gir Padrão explicitam sua preferência pelo tipo racial (notadamente morfologias da cabeça, chifres, e conjunto, baseados no padrão da raça importada da Índia).

Atualmente, após o crescimento da tendência Gir Leiteiro e o sucesso comercial baseado principalmente no controle leiteiro e testagem de touros, os criadores da tendência Gir Padrão começam a dar importância ao controle leiteiro e as provas de touros.

Muito se discute, muitas são as críticas a metodologia e ao sistema adotado no controle leiteiro e nas provas de touros.

Com freqüência, são citados e criticados os seguintes aspectos:
- ausência de critérios claros, solidamente fundamentados em parâmetros técnicos na escolha de touros para teste (marcadores moleculares etc.);

- pequeno número de touros, linhagens e criatórios participantes;

- número reduzido de rebanhos colaboradores nos testes de progênie;

- falta de homogeniedade dos rebanhos colaboradores no que se refere ao arroçamento, manejo e padronagem de matrizes;

- falta de distinção entre resultados obtidos nos rebanhos colaboradores Gir puros e os obtidos nos rebanhos cruzados (Girolando etc.);

- não existe um critério e um programa de classificação dos animais efetivo a partir de índices como: Sistema mamário, Tipo Leiteiro, Aprumos e Garupa - eu acrescentaria na raça Gir os índices de Desenvolvimento Ponderal (machos e fêmeas), precocidade (1º parto), e docilidade.

- inexistência de um banco de dados informatizado indexado abrangente, a partir do qual possamos identificar "famílias" maternas e paternas;

A impressão geral é que a seleção do Gir, embora tenha adotado algumas ferramentas importantes nas últimas décadas, ainda se dá em grande parte de forma empírica e intuitiva. Ou seja, acontece de acordo com a intenção individual de alguns criadores ou grupos de criadores e de acordo com os interesses comerciais ou ideológicos desses criadores.

Seleção genética é algo científico, e nas últimas décadas algumas ferramentas adotadas na pecuária viabilizaram um "novo tempo" (ou velocidade) nos ganhos seletivos. Além da inseminação artificial, a sexagem de sêmen, a transferência de embriões (TE ou FIV) nos permite potencializar incrivelmente a genética das fêmeas e conseqüentemente dos touros.

Dessa forma, é fundamental que venha a ser construída e adotada uma metodologia básica moderna que nos permita avaliar com precisão os resultados e traçar estratégias eficientes de cruzamentos.

Para alcançar esse objetivo penso que criadores e associações necessitam de uma entidade centralizadora, capacitada para gerenciar e desenvolver esse processo.

No Brasil, em minha opinião, essa entidade já existe - a Embrapa, e com alguma iniciativa ela poderia muito bem vir a ser o órgão aglutinador desse processo.

As demais entidades existentes, ABCZ, ABCGIL, ASSOGIR e outras (Girolando, por exemplo) bem como universidades (Viçosa, Jaboticabal, Rural RJ, e outras), igualmente importantes formariam um colegiado.

Regionalmente inclusive cooperativas, indústria de laticínos, frigoríficos, indústria de rações e de farmacêutica pecuária também poderiam colaborar.

Obviamente a questão de recursos financeiros para "bancar" um programa dessa estatura estaria no primeiro item da pauta.

Receitas governamentais de fomento certamente seriam importantes, mas outras fontes poderiam contribuir como percentuais de leilões e contribuição sobre venda de sêmen por exemplo, desde que adotadas com bom senso e em percentuais que não prejudiquem a viabilidade comercial dessas atividades.

Havendo retorno para os colaboradores, certamente não seriam poucos que voluntariamente iriam aderir a essa prática (industria privada inclusive). Os criadores de Nelore já praticam iniciativa nesse sentido e já perceberam que todos ganham.

A raça Gir, por excelência, é uma raça estratégica para a produção de leite e por que não carne nas regiões tropicais e no sistema "a pasto", pura ou em cruzamentos, contribuindo para uma relação custo x leite produzido x qualidade em patamares inferiores aos atualmente praticados na cadeia produtiva americana, canadense e européia que sem o uso intensivo de insumos derivados de grãos e silagens, ou no caso europeu sem subsídios, é inviável.

Novas fronteiras para o consumo de produtos lácteos, in natura e derivados no mundo, como também o incremento desses itens em países que já são grandes consumidores já é uma realidade. China, países asiáticos, América do sul e em um futuro próximo a África claramente indicam que leite e carne em breve se tornarão commodities tão importantes como os produtos graníferos e minerais.

Se os criadores e produtores brasileiros pretendem participar expressivamente desse mercado no futuro, com genética, com tecnologia e com produtos é imprescindível que hoje sejam tomadas medidas sérias no que se refere à seleção e tecnologia de produção, ou, corremos o risco de outros países como Austrália, África do Sul, Índia e outros países buscarem a genética que hoje possuímos, aprimorá-la e nos deixarem a "ver navios" com índices médios inferiores a 5 litros por animal.

Sten Johnsson
Rio de Janeiro - RJ
ejpecuaria@gmail.com