BOAS E MÁS NOTÍCIAS DESTE INÍCIO DE ANO
Pedro Eduardo de Felício*
No país todo, o ano só começa quando o carnaval termina, entretanto, no setor da carne, 2008 começou em meados de 2007 quando estavam em gestação os fatos que fariam as manchetes dos jornais antes mesmo das primeiras batucadas do samba nas avenidas.Para ir logo à pior notícia, no dia 16.11.2007, o jornal O Estado de S. Paulo dava: "UE (União Européia) questiona controle do gado brasileiro - Técnicos europeus avaliam que o governo não tem controle sobre o trânsito de animais entre fazendas". Diante de um possível impasse, o MAPA (Ministério da Agricultura) prometeu à missão européia submeter uma lista de 300 fazendas aptas a fornecer gado aos frigoríficos exportadores. Exigir lista de fazendas acreditadas pelo governo? Seria este mais um desdobramento da ardilosa estratégia montada na Irlanda para tirar a carne brasileira do mercado europeu?Cabe a pergunta, porque os baixos preços do nosso produto têm provocado a ira da associação de pecuaristas irlandeses, que por duas vezes enviou ao Brasil seus representantes em visitas de caráter privado. Aqui eles estiveram fotografando gado em diversas fazendas.
Registraram tudo que pudesse ter impacto negativo nos seus parlamentares junto à UE. Depois, conseguiram o apoio dos criadores britânicos, e aprovaram uma moção contra o Brasil na Comissão de Agricultura do Parlamento Europeu, que passou a pressionar o comissário de saúde e, consequentemente, a missão oficial que aqui esteve em novembro último.Em seguida veio a suspensão das importações de carne bovina, no dia 31.01.2008, por "problemas técnicos e de fiscalização dos rebanhos do país". Soube-se, então, que o MAPA tinha enviado um relatório que recebeu voto de desconfiança em Bruxelas por conter 2681 fazendas acreditadas e não 300 como havia sido combinado.Repentinamente, a carne brasileira tornou-se um risco sanitário para as nações européias que sempre se deram bem com o saudável e barato produto da pecuária extensiva tropical. E o mais incrível é que nem mesmo houve, na América do Sul, um só caso da dramática EEB, o mal da vaca louca, que tanto abalou os países do Hemisfério Norte, principalmente o Reino Unido e a Irlanda.
Ironicamente, enquanto pressionava para banir a carne importada do Brasil, a Inglaterra foi atingida por aftosa em fazendas vizinhas do importante IAH (Instituto de Saúde Animal), em Pirbright, Surrey. O próprio IAH rapidamente revelou tratar-se de uma cepa de vírus utilizada na elaboração de uma vacina em seus laboratórios. O IAH que é referência mundial em aftosa falhou, deixando escapar vírus por um dreno de resíduos para incineração. A UE levantou em alguns dias o embargo às importações da Inglaterra, porque os surtos haviam sido circunscritos e logo debelados. O que é estranho porque, desde outubro de 2005, quando ocorreram os focos de aftosa no Mato Grosso do Sul, este estado, o Paraná e São Paulo estão fora das exportações para a UE, mesmo tendo sacrificado os rebanhos afetados como preconiza a OIE - Organização Internacional de Epizootias.O Brasil tem sim problemas na implementação do sistema exigido de rastreabilidade do gado (Sisbov), mas, ao contrário do que estão assacando contra o país, a carne exportada para a UE é tão ou mais segura que qualquer outra existente no mercado mundial, tanto em termos de sanidade dos rebanhos, como de inspeção higiênico-sanitária nos abates. Isto poderia ser facilmente comprovado por uma missão científica independente.Referindo-se às falhas no Sisbov, o editorial da Folha de São Paulo, "Embargo Europeu", do dia 04.02.2008, foi preciso: "De um lado, a UE cede às pressões protecionistas (...). Do outro, o Brasil também tem responsabilidade no episódio, pois deixa de tomar medidas básicas para tornar-se menos vulnerável a esse tipo de embargo".
Outra notícia ruim que correu o mundo, dando argumentos aos nossos críticos para que vilipendiem ainda mais a imagem da pecuária nacional, refere-se ao recente crescimento da devastação de florestas na Amazônia. Segundo a ministra Marina Silva (Meio Ambiente), o que está ocorrendo se deve ao aumento dos preços da soja e da carne. Sob todos os aspectos, o prejuízo causado pelo desmatamento adquire enormes proporções e a rastreabilidade do gado será utilizada para que os países importadores rejeitem a carne produzida na região Amazônica. A boa notícia é que um dos mais importantes grupos empresariais do país no segmento industrial de matadouros-frigoríficos, com sete unidades em operação em cinco estados (MS, MT, GO, MG e RO), está desde o início do ano implantando com sucesso uma nova tipificação de carcaças. O sistema, todo ele fundamentado em conhecimentos técnicos nacionais, leva em conta as características de peso e acabamento de gordura, que combinadas formam classes de maior ou menor interesse, ou de nenhum interesse para a indústria, dentro de cada gênero: machos castrados, não-castrados, e fêmeas. Apenas nas classes de maior interesse a maturidade dentária é utilizada para hierarquizar tipos e diferenciar preços, de modo a valorizar gado mais jovem com peso e acabamento desejáveis.
A originalidade dessa tipificação está: a) na combinação inédita no país de classes de peso com as de acabamento; b) na clara demonstração dos tipos que realmente interessam aos mercados interno e externo, e c) no modelo de relatório de abate fornecido que lista as carcaças pelo código da rastreabilidade, seguido dos critérios que levaram ao ágio ou deságio. Prevê-se que os relatórios serão utilizados pelos criadores como elemento auxiliar em seus programas de seleção de touros.Enquanto se concluía este texto, saiu na imprensa que o Ministério da Agricultura admitiu a existência de falhas na lista com 2681 fazendas acreditadas que foi enviada às autoridades da UE motivando o embargo. Consta que na nova versão restaram 600, ainda o dobro do que foi combinado no final do ano.Falta-nos algo mais do que ciência e tecnologia... Que pena!
*professor da Faculdade de Engenharia de Alimentos da Unicamp e articulista da revista ABCZ
*professor da Faculdade de Engenharia de Alimentos da Unicamp e articulista da revista ABCZ
Fonte: Site da ABCZ
Nenhum comentário:
Postar um comentário