7 de jan. de 2008

QUAL É O TRANSMISSOR DO LEITE? III

O Gir é uma raça leiteira

Guarapari (ES) – Quem escreve um longo artigo desta vês é o criador Roberto Balsanello (foto), de Guarapari, no Estado do Espírito Santo. Roberto tece um longo comentário, bem fundamentado sobre o artigo de José Alfredo Barreto publicado aqui em Girbrasil.

Prezado Zé Alfredo e outros companheiros criadores,

Muito respeito suas opiniões, porém venho aqui tentar discordar um pouquinho de algumas.

Vou colocar algumas passagens com alguns adendos para o texto muito bem escrito pelo José Alfredo Barreto. Em alguns momentos, até o que escrevi aqui estão no texto dele posteriormente.

1- No cruzamento do Gir com o holandês (girolando), qual das duas raças é a transmissora de leite? O holandês concorre com o quê?... O zebu concorre com o quê?”
Para se atingir resultados econômicos desejados, o bom senso indica que o caminho há muito encontrado é o cruzamento entre o gir e o holandês: espécies distintas e, se oriundas de linhagens bem trabalhadas, com certeza se obterá resultados funcionais espetaculares, não só leite, mas carne também.
Demais disso, - complementando - se a heterose nada cria senão fazer ressaltar atributos funcionais, é de se concluir que quanto mais tipificadas e ou caracterizadas as duas espécies (gir/holandês), mais satisfatório há de ser o resultado.”

COMENTÁRIOS:
Tecnicamente sabemos que o holandês vai nos dar leite, persistência de lactação, melhoria reprodutiva e facilidade de ordenha principalmente. O gir vai contribuir com rusticidade (neste quesito entram vários fatores de adaptabilidade aos trópicos), e sim, aumento de sólidos no leite.

Quando o senhor diz que são espécies diferentes, é um engano, pois se fossem diferentes, os produtos seriam estéreis, na verdade são da mesma espécie, porém de sub-espécies diferentes, sendo o taurino: Bos taurus taurus e o Zebuíno: Bos taurus indicus.

Quanto a questão da heterose, acima afirmado, sou da linha de se acasalar uma genética de alta produtividade, com animais muito tipificados quanto a produção de leite do holandês, com animais de genética conhecidamente de boa produção do gir. Lembrando que, os animais muito caracterizados do holandês (vejamos a genética canadense), não tem uma boa tipificação de leite igual ao holandês americano. Uma vez que sabemos que os canadenses priorizam na maioria das vezes a beleza e padrão racial e os americanos a alta produtividade aliada a tipificação leiteira.

2- “DEPARA-SE COM O SEGUINTE QUADRO. A consangüinidade não compraz com interesses imediatos. Apura, geneticamente, tanto as qualidades quanto os defeitos, permitindo, com o seu emprego, a obtenção de linhagens; raçadores e a criação uma diversidade genética.”

COMENTÁRIOS:

Vinha escrevendo tudo coerente, quando se chega ao ponto e escreve que a ‘consangüinidade permite a criação de uma diversidade genética’. Oras bolas, se tem consangüinidade, diminui a diversidade genética. Isso é óbvio.

3- “Para se fazer uma pecuária produtiva, destinada ao pleno abastecimento, seja de leite ou de carne, não se pode abdicar da Raça Gyr e ainda, equivocadamente supor que essa raça poderá substituir outras ou ser substituída. Mas através de um gir conformado à realidade e não um gir que existe apenas em nossa imaginação, o que conseqüentemente se faz uma exarcebada exigência de seu desempenho, exigindo dele muitíssimo além de sua potencialidade. É que, por ser o Gyr dentre os zebuínos, aquele que mais dá leite, equivocadamente somos levados a situá-lo como raça leiteira, sendo que, na verdade, o Gyr é uma raça boa de leite.”

COMENTARIOS:

No 1º parágrafo, discordo do senhor no quesito leite e carne. Gir é pra leite e ponto final, mesmo o padrão, o padrão ta começando os testes de progênie, e vai vir pra leite e com raça! O gir poderá sim substituir outras raças no futuro, talvez nos meus netos, bisnetos ou mais pra frente, é óbvio. O holandês, o jersey, tem mais de 400 anos de seleção, o Gir tem nem 1 século ainda (observando quesitos produtivos). Temos muitos anos atrás, mas que com as tecnologias, vamos correr por fora, mas vamos chegar a um patamar muito alto.

No 2º parágrafo, diz que estamos exigindo muito além da potencialidade, estive tentando achar aqui o trabalho apresentado no 8th International Workshop on the Biology of Lactation im Farm Animals, feito pelo competente Prof. João Negrão, mostrando toda bomba hormonal na hora da ordenha, e parâmetros, mostrando que o GIR tem sim potencial, porém falta a seleção, esse trabalho é muito bom!

O Gir sim é uma raça leiteira, raça leiteira carro-chefe do Zebu. Vamos selecionar!

O 2º texto o senhor trouxe outras afirmativas, que me permita discordar de algumas (como o mundo ia ser chato se todo mundo pensasse igual, né?)

Quando o Senhor fala que seleção só se faz com endogamia, endogamia é perigoso demais, uma vez que segundo Faria (2002)* – “ Para viabilizar os programas de melhoramento genético, torna-se necessário conhecer os diferentes fatores que potencialmente interferem no processo seletivo. O tamanho efetivo da população é um dos que chamam a atenção, pois seu decréscimo pode estar associado ao aumento do nível de endogamia. Isso ocorre principalmente em razão do uso intensivo de alguns poucos touros melhoradores nos rebanhos e do aumento observado da variância do número de progênies por reprodutor em gerações sucessivas. Endogamia alta implica redução da variabilidade genética, o que afeta as características relacionadas à reprodução e ao valor adaptativo dos animais, e a expectativa de se obter resposta futura à seleção.”

*FARIA, F.J.C. Estrutura genética das populações zebuínas brasileiras registradas. 2002. 177f. Tese (Doutorado em Medicina Veterinária) – Escola de Veterinária, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG.

Seleção de uma raça deve-se utilizar a maior variabilidade possíveis de touros para conseguir uma variabilidade genética e melhores resultados, ou seja, sim, heterose dentro de uma própria raça, uma vez que as linhagens (aí a importância da endogamia feita por alguns criadores, um exemplo o gado EVA iniciado por seu estimado sogro e que hoje o senhor dá continuidade).

A endogamia é pode ser usada até 10%, acima disso, começa a aparecer efeitos deletérios pra raça (num trabalho de Cunha e colaboradores, 2006), chegaram à conclusão, que é preocupante esse índice para características de herdabilidade baixa e média, na raça nelore.

Ou seja, fazendo endogamia, vamos ter (como o senhor mesmo disse), aparecimento de características boas e ruins, ou seja, em algum ponto importante para pecuária (por exemplo, reprodução), pode ser deletério. Entendem?

Vejam este trabalho, e vão entender melhor:

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-09352006000300015&lng=&nrm=iso&tlng=

Quando o senhor diz que a herdabilidade para produção de leite é baixíssima, é outro engano, sabemos que para produção de leite varia entre 0,15 a 0,24 e que para ser alta tem que ser 0,30, ou seja a herdabilidade é média, e sim, influi muito num acasalamento. Lógico que em ambientes de igual manejo, os animais sofrendo mesmas influências do ambiente.

Apesar destes poucos pontos em que discordo do senhor, o texto está muito bom e é um importante documento para a história da raça Gir. Um grande abraço ao senhor e aos demais companheiros criadores. E ao Rosimar Silva que propicia este maravilhoso espaço para divulgar nossas idéias e aprofundar o debate sobre seleção e melhoramento da raça Gir no Brasil.

Roberto Ximenes Bolsanello

Médico Veterinário – CRMV-ES 700
Especialista em Zootecnia com ênfase em Bovinocultura Leiteira – UFLA / MG
Mestre em Medicina Veterinária com ênfase em Saúde Animal – UNESP, campus de Botucatu-SP.
Inspetor da Associação Brasileira dos Criadores de Gado Jersey – Núcleo ES
Criador e Selecionador de Gado GIR em Guarapari (ES)

Nota do Editor:______________________________________________________

Roberto Bolsanello trabalhando duro, fazendo
diagnóstico de gestação em fazenda de Jersey.

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